Saiu do bar onde sempre bebia a sua margarita meio zonzo, talvez ofuscado pelo jogo de luzes e a rotação hipnótica da bola de espelhos. Cambaleando, procurando contrariar o funcionamento deficiente do seu sistema vestibular joga-se contra a parede procurando nela um apoio. Vocifera qualquer coisa entre dentes, estava zangado, agora diz que o Porto já não é o que era. Lembra-se da estrica que tinha com vinte e repete: “O Porto já não é o que era”. Segue o seu passo apressado sem saber bem qual o destino, quer perder-se na cidade. Percorre os aliados a pé, sobe em direcção aos clérigos e senta-se num qualquer banco do jardim da cordoaria a contemplar os transeuntes, tentando por meio telepático ler-lhes o pensamento. Observa casais estrangeiros com semblante fascinado a reparar na arquitectura da reitoria, observa as praxes que teimam em se fazer notar, observa os grupos mais ou menos coesos que divagam noite fora e por fim, sem que nada o fizesse prever, eis que surge alguém.
Lucas , sou eu a Paty, não me reconheces ?
Paty, já não te via desde os tempos de faculdade. Que engraçado encontrar-te por aqui.
Entabularam uma conversa solta que os transportou ao tempo que viveram em conjunto na faculdade. Lucas, na época em que estudava, tinha uma paixão assolapada por Paty. No entanto, e apesar das várias tentativas, nunca lhe disse o que sentia.
Sabes, na faculdade sempre te achei a mais gira. Paty corou com a afirmação e logo lhe respondeu :
Curioso que eu achava o mesmo de ti, mas sempre te achei algo inatingível, como se estivesses num outro patamar.
Ao ouvir estas palavras, Lucas num esgar de surpresa responde :
Nunca pensei que me olhasses dessa forma, é urgente mudarmos isso.
A conversa flui sem que se apercebam que a noite se faz manhã. Conversaram durante horas sem que nada existisse senão eles próprios, viajando entre o passado e o presente. Sobraram sorrisos e suaves toques nas mãos procurando aquietar a ansiedade que ambos sentiam .
O destino prega-nos destas partidas ; diz Paty olhando demoradamente a cara de Lucas com os olhos cintilantes.
Na aurora do dia, em passo suave até à porta de casa de Paty, surge a pergunta:
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