Dizer a verdade
Tiago Gonçalves
Tiago Gonçalves

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Ser verdadeiro e dizer a verdade parece, num paradigma superficial de análise, algo exclusivo dos homens e mulheres imprudentes e ingénuos, talvez assim o seja porque a mentira se tornou uma norma e não uma exceção. Parece-nos fácil e por vezes até intuitivo mentir, creio que acima de tudo como uma forma de fintar o conflito e a assunção da responsabilidade pelas nossas escolhas. A mentira parece, no curto prazo, poupar-nos o desgaste que o conflito pode trazer e contribuir para a harmonia e uma espécie de paz. Escrevo uma espécie de paz porque esta paz adquirida pela mentira não parece ser algo sustentável e acima de tudo não está assente no pilar mais importante que é a verdade. Num horizonte temporal suficientemente amplo o caos que a mentira provoca irá sempre sobressair e assinalar a podridão da paz e harmonia construídas sobre a mentira. Tendo a mentira como pilar constroem-se identidades, personalidades, relações com os outros e relações com a realidade falsas. A falsificação destes aspetos conduz inevitavelmente ao caos onde impera a perda de significado e de rumo. Neste contexto Alfred Adler, um psicólogo Austríaco, cunhou o conceito de mentira de vida (life-lie). Este conceito refere-se à capacidade do indivíduo autorizar a organização de aspetos estruturantes da sua vida em torno de uma ou várias mentiras. Nesta organização caótica a pessoa rejeita responsabilidade para lutar pelos seus verdadeiros objetivos e legitima a sua falta de coragem autorizando a mentira. A verdade é vista como perigosa, portanto assustadora para o indivíduo.

Como recuperar o rumo e viver com significado e pelo significado? Vivendo na verdade, pela verdade e para a verdade. Apenas uma vida autêntica nos pode conduzir á superação das nossas corrupções e a alcançar de forma autêntica os objetivos que consideramos mais significativos.

Friedrich Nietzsche diz-nos que a força do espírito do indivíduo é medida pela quantidade de verdade que este está disposto a tolerar, mais concretamente em que grau a pessoa necessita que a verdade seja suavizada, silenciada, falsificada ou diluída. Seguindo a lógica do filósofo alemão, apenas dizendo a verdade teremos oportunidade de conhecer a verdadeira força do nosso espírito percebendo assim até onde vai a nossa tolerância.

Para melhor entendermos onde podemos estar a caminhar para o caos através da mentira devemos estar atentos aos subterfúgios que a mentira usa, nomeadamente as armadilhas intelectuais. A título de exemplo, a nível social a mentira está presente no culto do racionalismo como a única fonte de verdade absoluta, desta forma a sociedade parece-se precipitar-se para a ignorância, julgando conhecer o todo fica cega em relação ao que não conhece. O racionalismo parece enamorado com a ideia de que tudo pode ser explicado pelo prisma da objetividade lógica, de que nada escapa a este filtro de realidade. Assim, corremos o risco de sofisticar e cobrir com o pano da retórica as mentiras que vamos criando enquanto sociedade. Quanto maior e mais densa se torna a mentira maior será o desafio para retomar o caminho da verdade, daí que George Orwell nos diga que: “ em tempos de dissimulação universal, dizer a verdade é um ato revolucionário.

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