Rei Leão e o arquétipo da jornada do herói.
Tiago Gonçalves
Tiago Gonçalves

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Durante o curso da nossa vida todos teremos alguma forma de confrontação como uma morte simbólica e subsequente renascimento. Uma parte de nós, da nossa personalidade, definhará perante o desafio de circunstâncias que abalam as fundações que são, no momento, edificantes e estruturantes da nossa realidade. Esta metamorfose é um requisito necessário para que aconteça algum tipo de crescimento psicológico verdadeiramente transformador. Seria incauto pensar que a vida de alguém pode mudar de forma decisiva e significativa sem que desse processo decorra uma forma de desafio vital. Neste desafio diria que está presente a confrontação com o medo, a consciencialização das nossas limitações e inevitavelmente a dor e sofrimento subsequentes ao processo.

Esta forma de crescimento psicológico é muitas vezes representada de forma mítica em histórias e alegorias como uma jornada heroica. Nesta jornada o herói, figura principal da narrativa, sente-se convidado a iniciar uma aventura na qual troca as certezas e conforto daquilo que é conhecido na sua construção de realidade pelas incertezas e desafios do desconhecido.

Na história de Rei Leão, Simba o pequeno leão herdeiro do trono de rei da selva, é o herói que se sente convidado a embarcar numa aventura. Nesta aventura Simba deixa o conforto da proteção da autoridade de Mufasa, para se desafiar a entrar no território desconhecido dominado por coiotes que contam com a ajuda de Scar, arqui-inimigo de Mufasa (pai de Simba). No início desta aventura Simba testa a sua força, sendo desde logo convidado a tomar consciência das suas limitações.

Simba era um leãozinho arrogante e prepotente, herdeiro do trono e filho do rei que se julgava virtuoso sem nunca verdadeiramente ter testado a sua força e contribuído de forma decisiva para fundação do reino. Não tinha consciência de que o seu privilégio havia sido herdado e não adquirido. Quando inicia a confrontação com as suas limitações, sendo convidado neste processo por Nala, a figura feminina que o seduz a testar a sua força, Simba inicia a sua transformação. A incerteza e fragilidade visita a mente do pequeno leão que se vê obrigado a recorrer à ajuda do seu pai Mufasa. A dada altura na história Mufasa morre deixando Simba entregue a si mesmo. O Pequeno leão, julgando-se responsável pela morte do pai, decide fugir das suas responsabilidades enquanto herdeiro do trono deixando o reino entregue ao tio Scar. Durante este período Simba foge da si mesmo e da sua história, procura refugiar-se longe do seu reino ignorando que reside dentro de si mesmo o potencial para transcender a dificuldade da tarefa de recuperar o reino e a culpa. Nesta altura é visitado por Nala, a figura feminina por quem se apaixona, que lhe recorda a sua identidade como rei da selva. Simba sente-se fortalecido por este encontro que o impele na direção de Rafiki, uma espécie de mentor místico que lhe recorda o potencial que tem escondido dentro de si. Este potencial é a força e poder de Mufasa que reside dentro de Simba, sublinhado no filme pela experiência mística que Simba tem ao ver Mufasa no céu a dizer: “não te esqueças de quem és” . Mufasa funciona como uma espécie de alter-ego de Simba, o eu potencial, que lhe mostra um caminho para o aperfeiçoamento pessoal. Nesta jornada Simba, consegue transformar-se em Mufasa com a ajuda dos seus aliados e derrotando a sua sombra, que é a sombra de todos nós, o ressentimento, inveja e ciúme personificados na identidade de Scar. Desta forma encontra a sua identidade como digno Rei da Selva, tornando-se cada vez mais parecido com o Pai.

Esta história de Simba é também a história de todos nós quando nos deparamos com uma transformação significativa da nossa identidade. Isto explica, na terminologia de Carl Jung, o porquê destes arquétipos [1] subsistirem no tempo e exercerem poder e atração pela história ao longo dos tempos e por várias gerações. Há várias formas de se contar a história da jornada do herói mas o seu poder subsiste mesmo na atualidade. O espírito humano está permanentemente a ser convidado a embarcar numa aventura e a transformar-se. O que quer o espírito humano ? Transcender a dificuldade e a culpa e chamar a si a responsabilidade para através da coragem, do amor e da fé transformar a realidade.

[1]: narrativa primordial que compõe uma ideia que passa de geração em geração formando o inconsciente colectivo.

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