A realidade tal como a conhecemos e concebemos parece por vezes um fenómeno que acontece, existe e manifesta a sua presença de forma independente do observador. Nesta linha argumentativa a realidade adere na sua génese a uma corrente filosófica denominada materialismo que tem na matéria o elemento formador da realidade e nos fenómenos materiais e físicos uma espécie de linguagem da realidade. Ouvimos, vemos, sentimos e cheiramos a realidade que, adotando uma perspectiva materialista, será parente próxima de uma verdade que consideramos objetiva.
O materialismo parece dar-se bem com uma espécie de racionalismo que despe a nossa perceção da capacidade para responder a símbolos, mitos e conhecimentos ancestrais da nossa espécie, isto é, arquétipos. Como dizia Carl Jung, a nossa incapacidade para responder a estes símbolos e mitos ancestrais deixa-nos à mercê do submundo psíquico. Talvez fiquemos vulneráveis a este submundo porque ao não respondermos de forma analítica desconsideramos uma dimensão profunda e densa de nós mesmos. Ficamos assim expostos a esse desconhecimento e teremos provavelmente um menor grau de domínio sobre a nossa realidade, dado que ignoramos a nossa capacidade construtiva e generativa. Adicionalmente, ficamos excessivamente confiantes nos sentidos não sendo estes capazes de representações absolutas ou totais dos objetos de análise. Para ilustrar o ponto de uma realidade que se constrói por oposição á ideia de realidade que é, darei alguns exemplos.
Vejamos exemplos práticos:
O quadrado de Kanizsa mostra-nos como uma figura geométrica se destaca na nossa percepção. Um quadrado feito do espaço de ambiguidade deixado por círculos incompletos. A realidade que construímos parece gerar mais hipóteses alternativas quanto maior o grau de ambiguidade da imagem.
O pesadelo de Johann Heinrich Füssli retrata a odalisca no seu sono e os seus tormentos do espírito adormecido. Os sonhos são também eles uma fonte generativa de realidade e de criatividade natural, subvertendo muitos axiomas perceptivos . Muitas vezes funcionam como oráculos probabilísticos, despertadores existenciais para as crises que vivenciamos e ainda como linguagem primordial do inconsciente, demonstrando de forma iconográfica e simbólica a realidade.
Consideremos também o exemplo da intuição que surge como uma forma de pré-cognição, ou seja, um fenómeno perceptivo que vai beber à informação inconsciente para construir uma ideia de realidade. Este fenómeno pode ou não estar mais desperto em nós, consoante somos observadores e mestres da técnica da intuição.
Salvator Mundi retrata Jesus Cristo com a esfera celestial numa mão e realizando o sinal da cruz com a outra, o quadro é atribuído a Leonardo Da Vinci. A religião e os seus mitos, retratados na arte e na tradição oral & escrita são também elementos que nos remetem para expressões de uma realidade não material. Esta mitologia religiosa é plena em significados ocultos, alegorias ancestrais e metáforas sendo estes elementos traduções de símbolos naturais e de uma inata busca de significado não material.
Olhando para estas expressões de realidade podemos encontrar linguagens e níveis de resolução diversos. Compete-nos como intérpretes privilegiados usar a nossa inteligência, intuição e sensibilidade para reconhecer estas imagens psíquicas criadas chamando a nós a responsabilidade pela construção. Neste processo devemos também atender ás várias dimensões da realidade, descontinuidades perceptivas e no final, duvidar do retrato psíquico que fizemos.
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