O problema começa pela definição de virtude, o que é virtude ? Podemos considerar a definição comumente aceite que determina a virtude como uma forma de excelência moral, isto é, uma qualidade excepcional e essencialmente boa. Como seres sociais usamos várias ferramentas para comunicar socialmente os nossos valores, características e personalidade. Podemos dizer que usamos a virtude nesta instância como um sinal social que nos identifica geralmente com algo que é considerado moralmente positivo e bom.
Tomemos como exemplo a utilização que fazemos de signos/símbolos correntes de virtude. Atualmente não raras vezes vemos perfis de pessoas em redes sociais com mensagens políticas e ideológicas cuja base contempla uma forma de sinalização da virtude. Sendo consciente ou não esta atitude constitui em si mesma uma estratégia de auto apresentação que contempla a fabricação e repetição de símbolos de virtuosidade moral.
Este tipo de comportamento social identifica o autor do mesmo como sendo uma pessoa virtuosa, pode dizer-se como pessoa ao serviço do bem comum pois frequentemente estes símbolos têm na sua forma canónica uma qualquer definição de bem comum. Desta forma, o indivíduo que sinaliza a virtude procura também aderir a um grupo, de facto este tipo de comportamento faz lembrar os dilemas existenciais da adolescência quando o jovem alimentado pelo desejo de pertença ao grupo emite sinais sociais que o identificam com a tribo social eleita. Há uma componente importante de vaidade e sentimento de grandiosidade pessoal neste perfil além do desejo de pertença e pressão social para a conformidade. Podemos considerar que estes são combustíveis importantes para a sinalização da virtude acrescendo a estes a capacidade que temos atualmente de disseminar a mensagem por multidões à distância de um simples click. Esta capacidade de comunicação massiva de símbolos de virtude parece acelerar a sua consolidação, ainda mais quando as plataformas que utilizamos são matematicamente seletivas relativamente a estes símbolos. Quero com isto dizer que os algoritmos das redes sociais que usamos estão “viciados” em certos símbolos de virtude em detrimento de outros tipos de informação, para constatar isso basta estar atento à forma como determinada informação se dissemina com aparente maior facilidade que outra.
Posto isto, importa perceber onde está a virtuosidade que surge de forma mais independente deste nível de comunicação social. Talvez esteja na adesão consciente a um código ético que não é prescrito por nenhuma autoridade ou grupo social, ou seja surge através da descoberta individual e autónoma dos valores que devem reger a vida do indivíduo em causa. Este perfil de virtude terá eventualmente menos exposição social e consequentemente menos ganhos sociais imediatos, tendo na sua base uma motivação que transcende a adesão ao grupo e o sentimento de pertença. Esta motivação poderá contemplar algo mais íntimo e identitário que permite ao indivíduo descobrir a virtude de forma autêntica. Ser-se virtuoso a este nível pode ser inclusive assumir um compromisso com a verdade mesmo quando isso traz consequências sociais nefastas para a pessoa que subscreve esse contrato. No entanto, importa refletir sobre esta virtude para que ela não seja dada a dogmas e surja de um processo de reflexão pleno de humildade intelectual. Considero difícil definir virtude, sobretudo quando não simplificamos este processo recorrendo a uma autoridade moral ou meme social, aí estamos por nossa conta e compete-nos não deixar que essa virtude seja mais uma máscara que usamos para nós mesmos e para os outros, mas sim um desígnio de vida . Precisamos de ser boas pessoas mais do que parecer boas pessoas, desenvolver uma imagem genuína de competência moral mais do que aparentar ser moral, e ser altruísta em vez de desenvolver uma imagem de altruísmo que não é mais que uma versão alternativa de narcisismo.
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