Nas crianças encontramos personificada a ideia de potencial. Podemos pensar nas crianças como um livro aberto com várias páginas em branco ainda por escrever apesar da introdução, isto é a genética, já estar escrita. Esta ideia de potencial produz a ideia de possibilidade virtual, sendo esta uma ideia particularmente sedutora em termos narcísicos como veículo para o engrandecimento do ego quando nutrida no adulto. Isto significa que não tomando decisões, não chamando a nós a responsabilidade pelas mesmas podemos continuar o nosso percurso de vida sem realizar um derradeiro teste às nossas capacidades e assim preservar a ideia de que “poderíamos” fazer/ser muito mais. Nestes casos o cálculo que fazemos parece ser o de que preferimos a fantasia e a hipótese por oposição à consciência mais concreta das limitações e ao sacrifício inerente à confrontação com os nossos medos.
Peter Pan conhecido na ficção como o rapaz que não crescia apesar da passagem do tempo, representa simbolicamente as consequências e personalidade do não crescimento psicológico. Peter é um rapaz mágico que exagera no seu orgulho, arrogância e prepotência. Esta personagem aparenta não ter medo da morte, no entanto a sua atitude não deve ser confundida com coragem.
Na peça de teatro que dá voz à personagem, Peter refere “morrer seria uma grande aventura”, recebendo como resposta do narrador: “ viver seria uma grande aventura.”. Podemos aqui interpretar a resposta do narrador como uma pequena provocação, como um convite à ação que desmascara Peter como o rapaz que não tinha coragem para viver. Teria uma atitude aparentemente complacente com a morte não porque aceita as suas vicissitudes mas sim porque teme muito mais a vida. Peter recusava amadurecer e nessa recusa pervertia o seu real potencial. Na personalidade de Peter vemos a dificuldade em se comprometer com Wendy, a personagem por quem Peter se apaixona. Apesar de estar apaixonado por Wendy, Peter não está preparado para realizar o ato voluntário de amar.
Nos adultos e jovens que padecem dos males de Peter as múltiplas opções e caminhos que se abrem mentalmente como hipótese cativam a atenção e consequentemente, a noção aguda deste facto pode dificultar a tomada de decisões. Contudo para crescer precisamos de decidir e estar dispostos a sacrificar algo de hipotético para ter algo de concreto, um caminho ou destino. Além desta dificuldade muitas das pessoas que não estão dispostas a sacrificar a sua infância pela sua adultez, têm dificuldade em estabelecer relações recíprocas e equilibradas. Quando nesta posição, procuramos evitar conflitos pois estes podem funcionar como uma espécie de lembrete de que não estamos a tomar responsabilidade, a decidir e enfrentar as consequências das nossas ações. Adicionalmente, esta dificuldade em tomar decisões, assumir responsabilidade e enfrentar os desafios das escolhas que tomamos dificulta o planeamento de objetivos a longo prazo, desta forma convidando a ações mais imediatistas focadas no presente e no curto prazo.
Carl Jung procurou ilustrar este conceito da criança eterna recorrendo a um exemplo da mitologia, o puer aeternus. O Puer é o Deus da vegetação e ressureição e também ele é um eterno menino à imagem de Peter Pan. Na terminologia de Carl Jung o conceito de puer forma também parte de uma ideia que pertence a um inconsciente coletivo, isto é, uma ideia primitiva que subsiste na nossa espécie desde há muito tempo. O Puer e Peter Pan lançam o alerta da necessidade de crescer, pois sublinham a necessidade de sacrificar o potencial para fazer nascer a realidade .
Crescer psicologicamente é ter a capacidade de transformar potencial em realidade, de agir tomando responsabilidade e aceitando os sacrifícios inerentes á escolha e compromisso com os nossos objetivos.
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